30.5.11

A morte da potencialidade


As vezes nos deparamos com escolhas na vida que por seu peso ficamos por um breve momento cientes de suas consequências verdadeiras. Não as consequências mais causais, que enxergamos por exemplo em um corpo empurrando outro, ou imediatas ao que é visto e analisado. Desta forma pouco sofremos quando afirmamos uma escolha, já que assim, negamos todas as possíveis demais alternativas.

A decisão por caminhar por esse específico caminho e não este nem aquele, que poderiam acabar no mesmo destino, carrega uma 'tristeza' pela qual temos que passar. Talvez essa tristeza seja minimamente percebida porque temos que confrontá-la cotidianamente. Mas acontece que a percebemos de fato em alguns pontos cruciais em que a escolha envolve uma renúncia e isto causa dor.
(...continuação)

A renúncia em si carrega tristeza porque traz a morte de toda uma potencialidade existente no momento da escolha. Somos levados a enxergar como renúncias suportáveis e essenciais à existência e não podemos voltar atrás para alterá-las. Aí reside a insatisfação, a tristeza, a angústia no afirmar ou negar de uma vida.

Viver uma vida plena e consciente mostra-se extremamente complicada a partir deste sentido. Ao mesmo tempo em que um sabe que é agente ativo na História, sabe que ele também é "causador" dos males contemporâneos. Carregamos o "peso do mundo nas costas" como apontava Jean-Paul Sartre, justamente pela consciência efetiva de nossas ações. Isso gera empatia e ao nos reconhecer com o outro, percebemos que precisamos ajudar e também um sentimento ativo à existência.

Com isso damos importância às pequenas coisas da mesma forma que as grandes. Precisamos enxergar os detalhes da vida e minuciosamente entendê-los para então lidar com esse mal-estar. E então a partir daí, aquele que entende, pode afirmar sua existência no sentido de procurar enxergar todas as ramificações que suas escolhas são capazes de gerar.

As escolhas também são pesadas e podem ser vistas sob a ideia do Eterno Retorno. Com Friedrich Nietzsche, ele aponta que se nossa vida se repetiria para sempre através desse Eterno Retorno, isso tornaria cada movimento e cada decisão, pesada. Seria quase como se houvesse um tribunal que voltaria repetidamente à você e questionaria suas afirmações. O que você faz agora teria que reviver milhares de vezes, obrigando a não só pensar antes de fazer a decisão, mas que depois de feita, ela deve ser afirmada, abraçada em toda a sua magnitude.

Encarada desta forma, voltamos a ideia inicial e entendemos que a possibilidade de ramificação de cada escolha pode gerar muitas alternativas, e ao afirmar uma, consequentemente rejeita-se todas as demais. A impossibilidade das ramificações gera uma tristeza que no fim das contas deve ser abraçada.

Assim, cada movimento seu é refletido no próximo e assim em diante; e os julgamentos não ficam separados para os "tribunais da História" mas em todo o lugar. É uma questão da própria base da Filosofia e do questionamento em si, que precisamos retomar a ideia de pensantes ativos como Sócrates buscava em suas abordagens públicas e questionadoras.

3 comentários:

Anônimo disse...

texto ótimo e ilustração também!! gostei muito!!

Samantha disse...

Seu texto me fez pensar em algo que eu nunca tinha pensado. Acho legal parar pra pensar em coisas assim, principalmente quando não é o meu próprio ponto de vista. A diferença é bela.
E a ilustração da Yumi me fez pensar no por quê de ela não ter um site com os desenhos dela, porque ficou muito daora!
Curti.

"O ciclo" disse...

O texto aponta observações simples e ao mesmo tempo procura destacar considerações muito felizes, complementando a reflexão. Parabéns pela simplicidade aprofundada, que casou muito bem com a ilustração.